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Mulheres ainda têm dificuldade de denunciar assédio no trabalho

Data de publicação: 23/08/2016

Em 1991, uma professora de Direito\r\nchamada Anita Hill trouxe a questão do assédio sexual para a consciência\r\npública quando acusou seu antigo chefe, o candidato ao Supremo Tribunal,\r\nClarence Thomas, de ter repetidamente lhe feito propostas lascivas.

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Mas o episódio gerou mensagens dúbias,\r\nsegundo muitos especialistas em discriminação. Apesar de ter aumentado a\r\nconsciência sobre comportamentos corrosivos no local de trabalho, a intensa\r\nreação contra Anita Hill, até mesmo de membros do senado americano, passou a\r\nideia de que as mulheres precisam encarar grandes obstáculos quando lidam com\r\nesses abusos. (Thomas negou as acusações.)

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Quase 25 anos mais tarde, depois de uma\r\nsérie de alegações de assédio sexual que levaram a um pedido de demissão de\r\nRoger Ailes, antigo presidente da Fox News, e a uma cascata de acusações de\r\nagressão sexual contra o comediante Bill Cosby, alguns especialistas acreditam\r\nque podemos estar nos aproximando de mais um momento parecido com o do caso\r\nAnita Hill.

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As histórias de Ailes e Cosby, afirmam\r\neles, poderiam ter influência entre as mulheres no mercado de trabalho não\r\napenas pelo poder intrínseco desses exemplos, mas porque acontecem em um\r\nmomento em que elas estão ficando mais poderosas em sua luta pela igualdade. E\r\nquando a assertividade feminina produz resultados dramáticos como a demissão de\r\nAiles, pode inspirar mais mulheres a seguirem pelo menos caminho.

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"Quando Anita Hill se insurgiu\r\ncontra Clarence Thomas, ela não conseguiu nada e ele arrumou um cargo\r\nvitalício", afirma Linda Hirshman, biógrafa do Supremo Tribunal que já foi\r\nprofessora de Estudos Femininos. "Se há algo que pode inspirar as mulheres\r\na se manifestar contra uma ameaça real, esse seria a confluência perversa do\r\npaizão, Bill Cosby, com Roger Ailes, o homem mais assustador do mundo - o fato\r\nde que os dois estão se dando mal."

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Mesmo assim, defensores que lidam com os\r\nlocais de trabalho advertem que uma sensação maior de poder e mesmo vitórias\r\nlegais que chamam a atenção não necessariamente levam a um aumento\r\nsignificativo no número de mulheres que tomam medidas formais. Eles apontam\r\npara estudos que indicam que a grande maioria dos incidentes de assédio sexual\r\nno trabalho ainda não é denunciada.

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"As mulheres podem se sentir\r\nqualificadas para vários empregos e não esperam sofrer discriminação, mas isso\r\nnão se traduz em denúncias sobre abusos", explica Chai Feldblum,\r\nintegrante da Comissão de Oportunidades Iguais no Trabalho que, junto com uma\r\ncolega, Victoria Lipnic, passou um ano produzindo um relatório sobre a questão.\r\n"A pesquisa mostra que, infelizmente, na maioria dos locais de trabalho\r\nnão falar nada ainda é uma resposta razoável, porque as pessoas vão sofrer\r\nretaliações."

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O número de mulheres entrando com\r\nacusações de assédio sexual na Comissão de Oportunidades Iguais no Trabalho\r\ncresceu significativamente nos anos seguintes à denúncia de Anita Hill. Mas o\r\nefeito de seu testemunho sobre esse aumento foi um pouco prejudicado por uma\r\nlei de 1991 que deu às pessoas que alegavam discriminação no emprego o direito\r\na um julgamento legal e permitiu compensações monetárias adicionais.

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Casos amplamente divulgados parecem ter\r\ndesempenhado um papel para incitar outras pessoas a fazer denúncias também em\r\numa grande variedade de contextos mais específicos.

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O premiado documentário de 2012 "A\r\nGuerra Invisível" jogou uma luz em um padrão crônico de abuso sexual nas\r\nforças armadas, incluindo o caso de Kori Cioca, que alega ter sido estuprada\r\nenquanto servia na guarda costeira e processou dois secretários de defesa por\r\nnão conseguirem impedir que ela e outros funcionários fossem assediados. O\r\nfilme foi muito visto por integrantes das forças armadas, mesmo nos níveis mais\r\naltos. Segundo estatísticas do Pentágono, relatos de assédio sexual pularam de\r\ncerca de 3.600 em 2012 para mais de 5.500 no ano seguinte. Houve cerca de 6.100\r\ndenúncias em 2015, (Um porta-voz do Pentágono afirmou que em 2012 as forças\r\narmadas haviam apenas começado a mudar a maneira de responder a denúncias de\r\nassédio sexual.)

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A questão envolvendo Gretchen Carlson,\r\nantiga âncora da Fox que entrou com um processo de assédio sexual e retaliação\r\ncontra Ailes em julho, parece estar tendo um efeito similar, começando com duas\r\nmulheres que violaram acordos de silêncio para descrever suas próprias\r\nexperiências na emissora.

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Em uma entrevista ao New York Times\r\npublicada dois dias depois de Ailes pedir demissão, Rudi Bakhtiar, que\r\ntrabalhou na rede de televisão uma década atrás, disse que a Fox News a mandou\r\nembora depois que ela rejeitou os avanços de um colega e apresentou uma queixa\r\ninterna. Ela explicou que se sentiu encorajada a contar sua história\r\npublicamente por causa do processo de Gretchen Carlson.

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Os historiadores afirmam que há uma\r\nmudança na percepção feminina de seu próprio poder, como a crescente discussão\r\nsobre os méritos da assertividade no local de trabalho, resumida pelo livro\r\n"Faça Acontecer" da chefe de operações do Facebook, Sheryl Sandberg.\r\nEles também notam uma mudança para formas mais assertivas de ativismo em anos\r\nrecentes, incluindo o grupo End Rape on Campus (Fim do Estupro nos Campus), que\r\najuda sobreviventes a prestar queixas federais e encontra serviços legais e de\r\nsaúde mental. Os especialistas dizem que esses movimentos têm sido alimentados\r\npor um nível cada vez maior de educação, poder econômico e conectividade, por\r\nmeio das redes sociais, das mulheres.

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Mas a mesma conectividade que pode\r\noferecer apoio às vítimas também é capaz de trabalhar contra elas; os advogados\r\nde algumas das pessoas que fizeram queixas argumentam que os riscos de se falar\r\na verdade aumentaram com o tempo. Há três décadas, teria sido muito difícil\r\npara um possível empregador descobrir um processo legal. Hoje, afirma Linda D.\r\nFriedman, importante advogada do trabalho com muitos casos contra empresas de\r\nWall Street, a marca de pessoa "encrenqueira" pode seguir por toda a\r\nvida de quem faz uma denúncia.

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"Qualquer pessoa de Recursos Humanos\r\nno país pode fazer uma pesquisa no Google e descobrir uma denúncia federal\r\nantes de decidir se contrata alguém", conta ela.

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Apesar de um caso bastante divulgado como\r\no de Gretchen Carlson poder encorajar uma maior quantidade de pessoas que\r\nsofreram assédio a fazer denúncias, muitos defensores dizem que é mais possível\r\nque isso aconteça indiretamente, persuadindo primeiro os empregadores a cuidar\r\ncom mais seriedade de reclamações de assédio e discriminação. Apenas quando a\r\nmaioria dos funcionários acreditar que pode falar sem arriscar sua carreira, um\r\ndesenvolvimento que muitos dos advogados duvidam que vá acontecer logo, eles\r\nterão possibilidade de fazer isso em números substancialmente maiores.

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Ainda assim, se a consequência das\r\nacusações contra Cosby e Ailes for uma indicação, um número crescente de\r\nmulheres pode estar concluindo que agora é mais provável que a denúncia resulte\r\nem punições para o agressor do que para o acusador.

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Anita Hill, que hoje é professora da\r\nUniversidade Brandeis, está cautelosamente otimista, apesar de se preocupar com\r\no fato de que os US$40 milhões que Ailes teria recebido para deixar a Fox News\r\npossam prejudicar a lição do caso.

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"O fato de que a empresa está agora\r\nnão apenas falando com as mulheres" que dizem que sofreram assédio,\r\n"mas também falando sobre a possibilidade de outras pessoas terem sido\r\nfacilitadoras, é importante. Mulheres que sofreram assédio nos locais de\r\ntrabalho talvez vejam essa evolução como um resultado possível".

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Fonte: Estadão

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