As campanhas de conscientização sobre os\r\nmales causados pelo cigarro diminuíram o consumo, mas o peso dos gastos com o\r\nproduto ainda é alto no bolso das famílias brasileiras. O cigarro leva uma\r\nfatia de 1,08% do orçamento mensal das famílias, participação mais de três\r\nvezes superior à da batata, por exemplo.
Os dados são da metodologia de cálculo da\r\ninflação oficial no País, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor\r\nAmplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística\r\n(IBGE).
A fatia do orçamento mensal das famílias\r\ndestinada ao fumo praticamente equivale à da despendida com o tradicional arroz\r\ncom feijão carioca (1,12% do IPCA), ou a tudo o que se gasta no mês com\r\nmanicure, cinema e médico juntos (1,1% do IPCA). O gasto dos consumidores com\r\ncigarro é ainda 13,5 vezes superior ao do cafezinho, a bebida predileta do\r\nbrasileiro.
Por ter um peso relevante, qualquer\r\nmovimento no preço do cigarro mexe com a inflação no País, mas Eulina Nunes dos\r\nSantos, coordenadora de Índices de Preços do IBGE, lembra que a influência já\r\nfoi maior. Há vinte anos, o peso do cigarro na cesta de produtos consumidos\r\npelos brasileiros chegava a 1,4%. Como o item ficou 448,17% mais caro desde\r\nentão, contra uma alta de 252,08% da inflação oficial, o movimento mostra que\r\nas famílias cortaram despesas com o item.
“Isso é principalmente aumento de\r\nimposto. Não só para aumentar a arrecadação, mas, por ser considerado um item\r\nsupérfluo e prejudicial à saúde, aumentou muito a tributação como uma política mesmo.\r\nMais de 70% do preço do cigarro são impostos”, ressaltou Eulina.
Tributação. Segundo Leonardo Senra,\r\ndiretor financeiro da fabricante de cigarros Souza Cruz, os impostos variam\r\nentre 75% a 88% do preço do produto, dependendo do Estado e das alíquotas\r\nlocais de tributação. “Ou seja, se um maço de cigarro custa R$ 10, o consumidor\r\nestá pagando entre R$ 7,50 e R$ 8,80 só de imposto”, explicou Senra.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca)\r\ndivulgou recentemente que o número de mortes por câncer de pulmão entre homens\r\ncaiu pela primeira vez, saindo de 18,5 a cada 100 mil, em 2005, para 16,3 por\r\n100 mil em 2014. O resultado seria decorrente de políticas para redução do\r\ntabagismo, como proibição de propaganda, aumento de impostos e Lei Antifumo,\r\nque proíbe o fumo em locais fechados.
“A literatura mostra que o aumento dos\r\nimpostos é o maior determinante para a redução do tabagismo. E no Brasil o\r\npreço do cigarro é ′zilhões’ de vezes mais barato do que em outros lugares do\r\nmundo. Na Irlanda, o maço custa ¤ 12. Aqui, R$ 4 ou R$ 5. A indústria está\r\ndesesperada porque seus lucros estão caindo. Infelizmente, a gente ainda não\r\nconseguiu convencer o mundo de que essa é uma indústria que deveria fechar”,\r\ndefendeu a epidemiologista Liz Almeida, gerente da Divisão de Pesquisa\r\nPopulacional do Inca.
Contrabando. Embora faça parte de uma\r\npolítica para desestimular o consumo, a elevação da tributação acabou também\r\npor reduzir a competitividade do produto brasileiro ante os cigarros que entram\r\nno País por meio do contrabando. Segundo dados da Pesquisa Industrial Mensal -\r\nProdução Física, a indústria nacional de fumo acumula uma queda de 48,3% nos\r\núltimos 10 anos (até agosto de 2016, último dado disponível).
Na indústria do fumo, o cigarro responde\r\npor aproximadamente 60% do volume produzido, enquanto o fumo processado detém\r\nos 40% restantes.
A linha de produção do setor está\r\noperando atualmente 69,1% abaixo do pico da série histórica da pesquisa,\r\nregistrado em agosto de 2006. O resultado ainda está apenas 6,3% acima do piso\r\nda série histórica, iniciada em janeiro de 2002 pelo IBGE.
O diretor da Souza Cruz lembra que, nos\r\núltimos dez anos, o imposto que incide sobre o cigarro aumentou 450%. Em cinco\r\nanos, a alta foi de 140%, uma das principais razões para que a fatia do produto\r\nilegal no mercado brasileiro avançasse de 21% em 2011 para 35% em 2016.
Economia. O susto com a elevação de\r\npreços e a perspectiva de economizar um bom dinheiro acabaram por incentivar\r\nmuitos fumantes a abandonar o vício. Só em 2016, os cigarros já estão 12,62%\r\nmais caros, segundo o IPCA.
A especialista em finanças pessoais\r\nCarolina Ruhman, fundadora do site Finanças Femininas, conta que economizou R$\r\n40 mil após decidir deixar o vício. Ao completar dez anos sem fumar, ela\r\ncalculou quanto teria gastado se tivesse mantido o hábito de consumir dois\r\nmaços por dia.
“No curto prazo não faz muita diferença.\r\nVocê vai deixar de gastar entre R$ 5 e R$ 10 por dia, não dá para perceber no\r\nbolso. Para um fumante parece um dinheiro bem gasto. Mas, quando você coloca\r\nesse custo no longo prazo, você consegue ver o tamanho do rombo”, diz Carolina.
Ela só lamenta que não tenha se\r\norganizado para juntar o dinheiro economizado. “Quando parei de fumar estava\r\ncom 22 anos, morava com meus pais, infelizmente não pensava em economizar.\r\nContinuei gastando tudo”, disse.
Já a cozinheira Daniele Borges usa um\r\naplicativo no telefone celular para ajudá-la a contar os dias livre do vício e\r\no montante economizado. Em 491 dias sem fumar, ela evitou 19.654 cigarros e\r\npoupou R$ 5.896. Vítima de depressão e síndrome do pânico, ela encontrou forças\r\nnos resultados e num grupo de apoio para conseguir se libertar.
“Comprei uma geladeira, um jogo de mesa,\r\numa televisão e paguei a cirurgia da minha gata”, conta. “Nunca parei para ver\r\nquanto gastava, nenhum fumante quer fazer isso. Fumei por 20 anos”, acrescentou.
Fonte: Estadão
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